Rafael Correa
insiste em despejar indígenas do prédio da CONAIE
Por Elaine
Tavares
03.01.2015 -
Desde que as lideranças da Confederação
das Nacionalidades Indígenas do Equador (CONAIE) começaram suas críticas ao
governo de Rafael Correa, ainda no primeiro mandato, muitos tem sido os
conflitos envolvendo as forças oficiais e os indígenas. Até a metade do
processo que definiu a
nova Constituição os interesses pareciam semelhantes e o movimento indígena
conseguiu aprovar muitas de suas demandas na nova carta. Entre muitas
conquistas, ficou famoso o capítulo que reza sobre os direitos da natureza, uma
reivindicação que nasceu das entranhas do mundo originário e que, de alguma
forma, salvaguarda os recursos naturais.
Mas, quando se
iniciou o trabalho de regulamentação da Constituição, os desencontros
começaram. E o primeiro deles se deu por conta da nova lei que regulamentaria a
mineração no país. O governo optava por fazer-se cego diante dos direitos da
natureza definidos na Constituição e dava garantias a grandes empresas
estrangeiras para a exploração de minério, inclusive em terras comunitárias e
com técnicas há muito banidas, como o uso do mercúrio. Foi o que bastou para
que o movimento indígena se alçasse em rebelião. Correa negava todo o trabalho
realizado ao longo do processo constitucional e se rendia à lógica do
desenvolvimentismo baseado na exploração mineral. E ainda jogava a população
contra o movimento indígena acusando-os de estarem contra o progresso.
Outro fato que
gerou conflitos foi a abertura de licitação para que empresas estrangeiras
explorassem mais de 13 campos de petróleo na região amazônica. Com o mesmo
discurso de que os índios atrapalhavam o desenvolvimento nacional, Correa
vaticinava: “Basta do infantilismo de não ao petróleo e a mineração. Se não
exploramos agora, o petróleo acaba em 10 anos”. De novo, a chantagem diante da
luta dos povos originários.
Desde aí, com a
decisão irrevogável do governo em manter a proposta extrativista, a despeito
das demandas indígenas, os protestos e marchas têm sido constantes. Os
partidários de Correa seguem o bombardeio contra os indígenas, alegando,
inclusive, que eles são manobrados pela direita. O que não é verdade. É fato
que a direita tem se aproveitado dos conflitos, mas muito mais em função da
truculência de Correa do que da luta dos povos indígenas.
No rastro dessa
queda de braço entre governo e indígenas, Rafael Correa decidiu, em dezembro de
2013, fechar a Universidade
Intercultural das Nacionalidades e Povos Indígenas Amawtay Wasi, alegando
que ela não se enquadrava nos novos rumos da educação. O governo insistia que a
universidade, toda ela organizada dentro da cosmovisão indígena, se
transformasse numa escola igual a todas as outras, de corte europeu. Os
professores e alunos travaram longas batalhas de informação, mostrando ao
governo e à população que a universidade intercultural tinha o direito de atuar
de maneira diferenciada, inclusive para honrar a própria Constituição que
garante a proposta de autonomia das comunidades indígenas. Mas, a batalha de
Correa era muito mais contra os indígenas “rebeldes” que lhe faziam a crítica
do que pela educação homogeneizada. E a universidade foi fechada, apesar de
todos os protestos nacionais e internacionais.
Agora, ao
apagar das luzes de 2014, o governo desferiu mais um golpe nos movimentos
indígenas organizados, exigindo a desocupação do prédio onde funciona a CONAIE,
a Confederação das Nacionalidades Indígenas do Equador. O argumento é de que,
como o prédio é do governo, cedido em comodato, ele tem todo o direito de
requerê-lo de volta. Segundo as autoridades “surgiu uma necessidade imprevista
e urgente”. O uso do prédio pelos indígenas se dá nos anos 80 quando é o
organizado o Conselho Nacional de Coordenação das Nacionalidades Indígenas, um
processo de levante do povo originário que iria desembocar num grande movimento
reivindicatório que tem seu ápice no ano de 1990, com a ocupação de diversas
igrejas em Quito. E é justamente aí que a mobilização dá vida à CONAIE
(Confederação das Nacionalidades Indígenas do Equador), então a signatária da
carta de comodato. Esta entidade se configura no resultado efetivo deste
movimento e se organiza hoje em comunidades, centros, federações e
confederações de povos indígenas.
Desde o
Congresso de 1986, os povos originários do Equador tem mantido sua resolução de
consolidar suas comunidades como espaço de luta, defesa da terra e do
território originário, educação própria e bilíngüe, recuperação e
fortalecimento da identidade cultural dos povos indígenas, luta contra o
colonialismo e a batalha sem quartel pela plurinacionalidade.
Atualmente a
CONAIE, aglutina os seguintes povos e nacionalidades: Shuar, Achuar, Siona,
Secoya, Cofàn, Waorani, Zapara, Shiwiar, Andoa e Kichuas na região amazônica.
Os povos Tsachila, Epera, Chachi, Awa, Manta eWankavilka, na Costa e os de
nacionalidade Kichua: Palta, Sarakuru, Kañari, Puruwà, Chibuleo, Tomabela,
Salasaca, Kisapincha, Waranka, Kitukara, Kayampi, Otavalo, Karanki, Natabuela e
Pastom na serra interandina. Todos estes povos se constituem de maneira
autônoma.
Desde o anúncio
do despejo, que o governo promete para o próximo dia seis de janeiro,
movimentos populares e intelectuais de todo o mundo têm se manifestado junto ao
presidente Rafael Correa para que não continue com essa ação de represália
contra o movimento indígena, mas nada parece demover o mandatário equatoriano.
O despejo está mantido.
Essa semana, o
governo de Rafael Correa deu mais um passo no processo de tentativa de
destruição da mobilização indígena chamando um encontro com outras organizações
indígenas menores visando criar o que chama de Aliança Indígena pela RevoluçãoCidadã, obviamente submetida a uma razão de estado. E, na oportunidade
anunciou, através do Ministério de Inclusão Social que utilizará a sede da
CONAIE como um centro de recuperação de jovens drogados.
O próprio
presidente já declarou que não vai mais permitir que a CONAIE faça “uso
político” do prédio onde está fincada desde há décadas. O que ele não diz para
a nação é que foi a partir daquele prédio que se planejaram estratégias para a
sua própria eleição, quando o movimento indígena, acreditando nas suas
propostas, o apoiou. Hoje, como os indígenas estão fazendo a crítica ao seu
projeto de desenvolvimento, o “uso político” parece não ser mais necessário.
A próxima
semana será de muita luta no Equador.
Reproduzido de IELA
03 jan 2015
Nenhum comentário:
Postar um comentário